PT pressiona por mais espaço à esquerda no novo ministério
27/12/2014 17:01
Por Redação - de Brasília
A presidente Dilma Rousseff tem percebido uma ação mais
incisiva do PT à esquerda
Longe de representar uma divisão na legenda que conquistou o Palácio
do Planalto, nas últimas eleições, a formação do ministério da
presidenta reeleita, Dilma Rousseff, tem levado o Partido dos
Trabalhadores (PT) a uma reflexão mais acurada de seu papel no conjunto
de forças políticas que integrarão a base aliada ao governo, a partir do
dia 1º de Janeiro. Em uma análise, o jornalista Breno Altman, diretor
de Redação do site Opera Mundi, após considerar a fragilidade
do apoio parlamentar à presidenta, aponta a existência de uma clara
tentativa de um novo golpe midiático: “Importantes veículos de comunicação apostam abertamente em
transformar a investigação na Petrobrás em carro-chefe de operação que
leve à paralisia e ao desgaste da presidente, se possível a seu
impedimento”, afirma Altman. A nova composição do ministério e a disputa por espaço político
também guardam novos episódios nos quais quem ganhou e quem perdeu, nas
urnas, buscam definir, com nitidez, o contorno de suas aspirações. O PT fluminense, que já indicou o deputado Alessandro Molon à secretaria de Comunicação Social, também teria levado o nome do deputado Chico D’Angelo para um posto ainda não definido na Esplanada dos Ministérios. Lula distante Enquanto descansa no litoral baiano, a presidenta Dilma tem ouvido,
cada vez mais distante, a voz rouca de seu mentor político. O
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, diferentemente de 2010, quando
fez questão de participar, ativamente, da montagem do governo, tem
deixado mais espaço livre para sua pupila. Lula, com todas as letras,
afinou seu discurso na direção da esquerda, distanciando-se dos acordes
liberais que ora se ouvem nos ministérios da Fazenda, com a indicação de
Joaquim Levy – de voto declarado aos tucanos – e Kátia Abreu (PMDB-TO),
a senadora do agronegócio. Na dúvida, Dilma deixou para segunda-feira o
anúncio dos ministeriáveis petistas. Em novembro, logo após o fechamento das urnas, Dilma consultou Lula,
que emplacou Nelson Barbosa no Ministério do Planejamento, mas depois
seguiu seu caminho, após engolir a escolha de Levy. Ex-líder sindical, Lula tem recebido frequentes visitas de
integrantes da Central Única dos Trabalhadores (CUT), maior central
sindical do país, que organiza o ato político em Brasília, para o dia da
posse da presidente Dilma Rousseff. Outras centrais sindicais e
movimentos sociais, como os sem-terra do MST, já confirmaram presença. A manifestação já é um ato concreto da “reorganização” das esquerdas,
defendida pelo ex-presidente. Os ativistas da CUT e dos demais
movimentos sociais; além de comemorar a vitória, repudiam as tentativas
de desestabilizar o governo eleito. O ato público tende a cobrar coerência da presidenta Dilma com o seu posicionamento durante a campanha: “Reiteramos nossa posição contra propostas de ajuste fiscal
contrárias ao programa que venceu as eleições presidenciais”, diz o
documento que convoca para a manifestação no dia da posse. A CUT também
reprovou a elevação da taxa de juros adotada pelo Banco Central, como
“ineficaz” para o combate à inflação. Em um vídeo, distribuído pelas redes sociais, Lula defendeu a reforma
política como fator imprescindível, a começar pelo fim da lista de
partidos e do financiamento público. Para ele, nos próximos quatro anos,
é essencial ainda reorganizar a base de aliança do governo, que sofreu
perdas desde que chegou ao poder, com setores mais à esquerda da
sociedade. – Nós temos que tirar as lições da dureza desse processo eleitoral.
Nós temos que saber que uma próxima eleição vai ter que se dar numa
outra lógica política, porque a reforma política tem que permear a
vontade do PT, a vontade dos partidos que querem mudar a lógica política
desse país – disse o ex-presidente. Pacificação Ainda segundo o artigo do jornalista Breno Altman, “abundam analistas
e protagonistas elogiando as escolhas da presidente para o ministério,
as medidas anunciadas nas últimas semanas e o discurso que tem
predominado desde a reeleição. A ideia-força que atrai estes aplausos é a
da pacificação. Seria lance político de brilhantismo um conjunto de
concessões destinadas a desarmar o clima de enfrentamento da disputa
presidencial”. “O portfólio de providências inclui, entre outras iniciativas,
aumentos seguidos da taxa de juros, nomeação de Joaquim Levy para o
Ministério da Fazenda, oficialização de ferrabrás do ruralismo para a
Agricultura, abertura prevista de capital da Caixa Econômica Federal e
crescimento dos agrupamentos centristas no novo gabinete, com
esvaziamento relativo do PT. Para muitos, tiro certeiro: estariam sendo
criadas as condições de repactuação com as classes dominantes, refazendo
alianças e isolando eventuais segmentos golpistas”, acrescentou. Na análise do jornalista, “os partidos de esquerda não terão, no
Congresso a ser empossado daqui a dois meses, mais do que um quinto das
cadeiras. Na outra ponta, as legendas mais reacionárias ampliaram
fortemente sua presença. A base de apoio parlamentar está dividida e
desorganizada. Porção relevante do centrismo, especialmente abrigada no
PMDB, apoiou o PSDB nas eleições presidenciais e está decidida a fazer
de Eduardo Cunha o novo presidente da Câmara dos Deputados, associada à
oposição de direita”. “A leitura aparentemente predominante, em círculos governistas, é que
estes e outros fatores seriam suficientes para recomendar uma
estratégia-violino: venceu-se com a mão esquerda, mas para governar
torna-se necessário tocar com a mão direita; acredita-se, em
contrapartida, que os inimigos desistam de assaltar o instrumento
confiado às forças progressistas pelo voto popular. Na pior das
hipóteses, ganharia-se tempo até os bons ventos da economia mundial
voltarem a soprar, restaurando a hipótese de seguir adiante com as
melhorias sociais sem radicalização do conflito distributivo”. O articulista, porém, cita “duas ordens distintas de problemas, nesta formulação”. “A primeira reside em saber se é possível conciliar estas concessões,
de magnitude ainda pouco clara, e mesmo que provisórias, com o processo
iniciado em 2003, cujos fundamentos são a construção do Estado de
bem-estar, a distribuição de renda e a consolidação do mercado interno
de massas como força propulsora do desenvolvimento. Se a resposta for
negativa, cresceriam os riscos do petismo cair em cenário de paralisia
ou retrocesso nas conquistas sociais. As consequências políticas, como
não é difícil prever, poderiam ser dramáticas”, disse. Altman afirma, ainda, que “vale lembrar que as poderosas realizações
dos últimos 12 anos foram incapazes de evitar que se criasse clima para
manifestações de protesto, em junho de 2013, e de oferecer tranquilidade
eleitoral no último pleito. Caso a alternativa ao esgotamento do
primeiro ciclo de reformas seja, mesmo moderadamente, na direção oposta
das políticas até aqui praticadas, haveria notáveis possibilidades de
esgarçamento da confiança no projeto encabeçado pelo PT”. Capitulação A segunda “ordem de obstáculos”, questiona o diretor de Redação, “é ainda mais perigosa: e se o apaziguamento fracassa?” “O núcleo duro das classes dominantes, afinal, já deixou bastante
claro que as reformas de cunho orçamentário, que não alterem estruturas
de poder e riqueza, são as fronteiras de sua tolerância natural. Para
além disso, somente se oligarquias do capital forem subjugadas ou
derrotadas. No mais, a história está cheia de exemplos sobre como pode
ser inócua e traiçoeira, em determinadas situações políticas, a
prevalência da conciliação sobre o enfrentamento”, alerta. Altman cita o ex-presidente Getúlio Vargas, que teve seu nome inscrito “entre conciliações malogradas”: “Isolado no parlamento, compôs gabinete de centro-direita para
neutralizar a oposição golpista. A manobra foi um retumbante fracasso.
Perdeu apoio popular, ao aplicar parte do programa liberal de seus
adversários, e viu-se no dever de entregar a vida, só assim reavivando o
entusiasmo das ruas, para impedir a morte de seu projeto político”. A disposição com que Dilma marcha à direita, afirma o jornalista,
deixa claro “que forças de esquerda e movimentos sociais, com papel
decisivo no segundo turno das eleições, estão perplexos e irritadiços
com as decisões tomadas pela presidente. Seria ilusão acreditar que se
possa manter a simpatia deste lado da sociedade apenas com frases e
informações alarmistas sobre a ameaça de tudo ficar pior, se a
presidente não receber solidariedade incondicional diante da escalada
conservadora”. “Caso predomine sentimento de frustração e apatia nestes setores, que
constituem a alma mater do petismo e da esquerda, quem estará ao lado
do palácio nas horas difíceis que virão?”, pergunta-se o jornalista “Que forças impediriam a direita de querer transformar a dieta de
concessões em regime de capitulação? Há forte expectativa, nestas
circunstâncias, para o discurso de Dilma no próximo dia 1º de janeiro. A
pergunta que não pode calar: com qual mão ela carregará o arco do
violino ao subir no parlatório de sua segunda posse e dali em diante?”,
conclui.
Líder petista questiona o papel da esquerda no governo Dilma
26/12/2014 12:47
Por Redação - de São Paulo
Pomar é um dos principais líderes do PT
Em artigo publicado nesta sexta-feira, intitulado Eu não vou à posse da Presidenta Dilma – O novo ministério de Dilma e o papel da esquerda e do PT,
o historiador, mestre e doutor em História Econômica Valter Pomar
disserta sobre o momento de desconfiança em que vive a presidenta Dilma
Rousseff, recém-eleita, junto à militância que, na reta final da
campanha, fez a diferença e a levou à vitória, nas urnas, por apenas 3,4
milhões de votos (3,28 pontos percentuais). “O ministério até agora divulgado pela presidenta Dilma
Rousseff provocou reações variadas entre os que apoiaram sua reeleição.
Há desde elogios rasgados, passando por críticas ponderadas, até ataques
duros contra certas escolhas e/ou contra o conjunto da obra”, afirma
Pomar, no artigo publicado em seu blog
http://valterpomar.blogspot.com.br/. O historiador e líder petista afirma, ainda, que “entre estes
últimos, há variadas doses de surpresa e decepção com o espaço
ministerial ocupado por quadros conservadores, seja da direita
oposicionista (como Levy), seja da ala direita da coligação que elegeu
Dilma (como Kassab e Kátia Abreu). Desconheço o tamanho de cada grupo
(elogios, críticas, ataques), mas uma coisa é certa: se entre o
eleitorado medido pelas pesquisas de opinião cresceu a confiança na
presidenta, entre a militância que fez sua campanha cresceu a
desconfiança”. Leia, a seguir, os principais trechos do artigo: “Sem o contraponto da quase inexistente mídia petista, a desconfiança é adubada pelo oligopólio da comunicação,
que torce por uma presença minguada na posse da presidenta. Seja como
for, o ministério até agora divulgado não constitui propriamente uma
surpresa, ao menos para quem leva em conta a correlação de forças, a
estratégia majoritária na esquerda brasileira e o estilo da presidenta. “Vencemos as eleições presidenciais de 2014. Mas, comparado a
eleições anteriores, recuamos. O mesmo ocorreu nas eleições para
governos estaduais e para o Congresso nacional. A correlação de forças
institucional é pior, hoje, do que em 2003. E desde então nossa
capacidade de organização, de mobilização e de comunicação não cresceu
mais do que cresceram as de nossos inimigos. “Apesar disto, seria totalmente possível compor um ministério mais
parecido com a campanha do segundo turno e menos parecido com a “base”
do governo no Congresso nacional. “Entretanto, se não estamos falando apenas de nomear ministros
provenientes da ala esquerda da coligação que elegeu Dilma, se estamos
falando também e principalmente de aplicar políticas governamentais mais
à esquerda, isto significaria um segundo mandato Dilma que sofreria uma
resistência ainda maior por parte do oligopólio da mídia, do grande
capital e da oposição de direita. “Desde 2003, a resistência da oposição vem num crescendo. Nossos
governos realizam políticas públicas, mas enfrentam uma oposição de
direita cada vez mais radical e cada vez mais massiva, que atua como se
estivéssemos fazendo reformas estruturais ou ameaçando com uma
revolução. “Portanto, caso o segundo mandato Dilma realmente venha a trilhar o
caminho das reformas estruturais, enfrentará uma resistência muito maior
do que a que já enfrenta hoje. “Para enfrentar e derrotar esta resistência, dependeremos de uma
mobilização também muito superior àquela que conseguimos, por exemplo,
no segundo turno das eleições presidenciais de 2014. “Esta mobilização superior também é possível de alcançar, sempre e
quando os partidos e movimentos sociais que integram o campo democrático
e popular sejam capazes não apenas de aprovar resoluções mais radicais,
mas também sejam capazes — ao longo dos próximos quatro anos – de fazer
de maneira organizada aquilo que fizemos de maneira em grande medida
espontânea nos meses de setembro e outubro de 2014. “Entretanto, isto significa que tais partidos e movimentos,
especialmente o Partido dos Trabalhadores, têm que mudar a estratégia
adotada desde 1995, estratégia que num certo sentido foi “radicalizada”
pela Carta aos brasileiros em 2002 e ainda mais “radicalizada” pela
dupla Palocci-Meirelles em 2003-2004. “Antes de 1995, nossa estratégia apontava que para transformar o
Brasil, seria necessário combinar ação institucional, mobilização social
e organização partidária, operando uma verdadeira “revolução cultural”
no modo de fazer politica das classes trabalhadoras. Mas a partir de
1995 ocorreu uma hipertrofia da ação institucional, em detrimento dos
outros componentes da estratégia. “Antes de 1995, nossa estratégia supunha articular a luta por
reformas estruturais democráticas e populares com a luta pelo
socialismo. A partir de 1995, o objetivo socialista e as reformas
estruturais foram cedendo lugar às políticas públicas. Necessárias e
importantes, mas que como estamos confirmando hoje são insuficientes não
apenas para transformar o Brasil, mas também insuficientes para
desmontar as bases de poder de nossos inimigos. “Antes de 1995, nossa estratégia apontava o conjunto do grande
capital como inimigo estratégico. A partir de 1995, parcelas do grande
capital e de seus representantes políticos passaram a ser tratados como
aliados. A Carta aos brasileiros e o período Palocci-Meirelles foram
além, com suas concessões ao grande capital financeiro e transnacional. “Os defensores da estratégia de 1995 argumentam que ela foi
fundamental para vencer as eleições presidenciais de 2002. Podemos
concordar ou não com esta afirmação. A esquerda petista discorda. Mas,
hoje, doze anos depois, não é preciso ser da esquerda petista para
perceber que a estratégia de 1995 é, ao menos em parte, responsável por
não termos conseguido fazer nenhuma reforma estrutural. “Além disso, a estratégia de 1995 tem “efeitos colaterais” que estão
ameaçando nossas vitórias institucionais, nosso acúmulo social, nossa
atuação partidária e até mesmo nossa capacidade de fazer políticas
públicas. Aliás, a estratégia de 1995 nos levou, desde então e até
agora, a geralmente preferir fazer um acordo ruim a comprar uma boa
briga. “Assim como outro ministério é possível, assim como outra correlação
de forças é possível, outra estratégia é possível e urgente. “Mudar a estratégia não é apenas nem principalmente aprovar outra
resolução ou eleger outra direção. Mudar a estratégia é corrigir o
comportamento geral do Partido em todas as dimensões da luta de classes e
no seu funcionamento interno. Portanto, um processo trabalhoso e
demorado. Cujos alicerces precisam ser lançados nos debates do 5º
Congresso do Partido dos Trabalhadores. “Portanto, das três variáveis que explicam (mas não justificam) o
ministério até agora nomeado, podemos e devemos mudar duas: a correlação
de forças e a estratégia majoritária na esquerda brasileira. Mas isto
exigirá um grande esforço, envolverá uma boa dose de risco e demandará
certo tempo. “Talvez por isto muita gente esperasse que a presidenta Dilma
liderasse este processo, seja para facilitá-lo, seja para apressá-lo. “Obviamente, quem esperava isto, sofreu uma decepção em dose tripla
com o ministério até agora anunciado. Pois ele deixa claro que, na
melhor das hipóteses, a presidenta não se dispõe a comandar o processo
de “retificação” da estratégia e de alteração na correlação de forças. “Aliás, a própria presidenta já deixou claro não ser presidenta do
PT, nem da esquerda brasileira, mas sim presidenta do Brasil. Com isto
ela deixou claro como enxerga seu papel e que não compartilha a lógica
(que a direita denomina caricaturalmente como “bolivariana”) segundo a
qual caberia ao chefe do governo nacional protagonizar o processo de
mudanças estratégicas no país. “Gostemos ou não disto, não há porque esperar que ela faça o que não
se propõe a fazer, o que não foi eleita para fazer e o que ela
provavelmente não saberia fazer. “Isto posto, quem deseja um segundo mandato Dilma superior ao
primeiro não deve esperar que a iniciativa parta do governo ou da
presidenta. “Para criarmos as condições para um segundo mandato superior ao
primeiro, devemos nos concentrar em mudar a estratégia da esquerda e em
mudar a correlação de forças na sociedade, ao mesmo tempo em que seremos
forçados a disputar os rumos do governo Dilma. “Disputar os rumos do governo Dilma inclui dizer clara e publicamente
à presidenta que seu ministério está aquém do necessário e do possível.
Mas inclui, principalmente, organizar nossa base social para derrotar
não apenas a direita oposicionista, mas também a direita governista. Até
porque não há concessão que faça o lado de lá aceitar nossa presença na
presidência da República. “Em resumo, estão corretos aqueles que criticam o peso que a direita
possui no ministério anunciado até agora pela presidenta Dilma Rousseff.
Mas é preciso converter esta crítica em capacidade de organização,
mobilização e comunicação da esquerda política e social. E, no caso dos
que somos petistas, é preciso fazer com que esta crítica se converta em
uma nova estratégia e em um novo comportamento partidários. “Por tudo isto, como não poderei comparecer pessoalmente à esta posse
da presidenta Dilma Rousseff, além de contribuir para a presença de
nossa militância, farei como a esmagadora maioria dos eleitores e
militantes da campanha à reeleição: erguerei um brinde ao êxito de novo
governo e outro brinde à continuidade da nossa luta por um segundo
mandato superior, no rumo das reformas estruturais e do socialismo. “Até porque não basta ganhar, tem que levar”, conclui.
Política e diálogo no contexto da reeleição de Dilma Rousseff
Leonardo Boff*
A reeleição de Dilma Rousseff propicia reflexões sobre
as várias formas de se fazer política partidária. Fazer política é buscar ou
exercer concretamente o poder. Que fique claro o que Max Weber escreveu em seu
famoso texto A política como vocação: "Quem faz política busca o poder.
Poder, ou como meio a serviço de outros fins, ou poder por causa dele mesmo,
para desfrutar do prestígio que ele
confere". Esse último modo de poder político foi exercido, por
quase todo o tempo de nossa história, pelas elites a fim de se beneficiarem
dele, esquecendo que o sujeito de todo o poder é o povo. Trata-se do famoso
patrimonialismo tão bem denunciado por Raimundo Faoro em seu
clássico Os donos do poder. Vejo cinco formas de exercício de poder. Primeiro, a política do punho fechado. Trata-se do poder
exercido de cima para baixo e de forma autoritária. Há um só projeto político,
aquele do detentor do poder, que pode ser um ditador ou uma classe dominante.
Eles simplesmente impõem o projeto e esmagam os alternativos. Foi
o que mais vigorou na história brasileira, especialmente sob a ditadura militar. Segundo, a política do tapinha nas costas. É uma forma
disfarçada de poder autoritário. Mas diferencia-se do anterior, porque este se
abre aos que estão fora do poder mas para atrelá-los ao projeto dominante.
Recebem algumas vantagens, desde que não constituam outro projeto alternativo. É
a conhecida política paternalista e assistencialista, que desfibrou a
resistência da classe operária e corrompeu tantos artistas e intelectuais.
Funcionou entre nós especialmente a partir de Vargas em
diante. Terceiro, a política das mãos estendidas. O poder é distribuido
entre vários portadores que fazem alianças entre si sob a hegemonia do mais
forte. Há alianças entre o partido vencedor com os demais partidos aliados para
garantir a governabilidade. É o presidencialismo de coalizão parlamentar. Esse
tipo cria favorecimentos, disputas de postos importantes no Estado
e mesmo a corrupção. Foi o que ocorreu nos últimos anos. Quarto, a política das mãos entrelaçadas. Parte-se do fato
básico de que o poder está difuso nos movimentos e instituições da sociedade
civil e não apenas na sociedade política, nos partidos e no Estado. Esse poder
social e político pode convergir para algo benéfico para todos.
Trata-se da grande discussão atual, que prevê a participação dos
movimentos sociais e dos conselhos para junto com o Parlamento e o Executivo
definirem políticas públicas. Busca-se uma democracia participativa que
enriquece a representativa. Negar esta forma é não querer democratizar a
democracia e permanecer na atual, que é de baixa
intensidade. Especificando: a política das mãos entrelaçadas acontece
quando o chefe de Estado se propõe a uma ampla dialogação com todos os segmentos
a fim de repactuar os atores sociais ao redor de um projeto comum
mínimo. O pressuposto é: aquém e além das diferenciações e dos interesses
conflitantes, existe na sociedade a ideia de que país queremos, a solidariedade
mínima, a busca do bem comum, a observância de regras consentidas e o respeito a
valores de sociabilidade sem os quais viraríamos uma matilha de lobos. As mãos
estendidas podem se entrelaçar coletivamente. Mas para isso precisa-se do
exercício do diálogo, que implica ouvir a todos e buscar convergências na linha
do ganha-ganha e não do ganha-perde. É a ética na política e
da boa política verdadeiramente democrática. Por fim, temos a ver com política como sedução no melhor sentido da
palavra, subjacente à proposta da presidenta Dima. Ela propõe um diálogo aberto
com todos os atores políticos, também da área popular. Urge seduzir aqueles 48%
que não votaram nela para que secundem um projeto de Brasil que
beneficie a todos a partir da inclusão dos mais
penalizados, da criação de desenvolvimento ecológica e socialmente sustentado
que gere empregos, propicie melhores salários, favoreça a redistribuição de
renda, crie um transporte decente e garanta mais segurança para os cidadãos,
além do cuidado para com a natureza e a potencialização de um horizonte de
esperança para o povo poder se reencantar com a
política. Alguém precisa ser inimigo de si mesmo para estar contra tais propósitos.
A arte dessa dialogação é reencantar a política das coisas e seduzir as
pessoas para esse sonho bem-aventurado. Para isso é obrigatório olhar para a frente. Quem ganhou a eleição deve
mostrar magnanimidade e quem a perdeu, humildade e disposição de colaborar em
vista do bem comum. É idealismo? Sim, mas no seu sentido profundo. Uma sociedade não pode
viver só de estruturas, burocracia e disputas ideológicas em torno
do poder. Tem que suscitar a cooperação de todos e alimentar sonhos de melhoria
permanente que inclua e beneficie, o mais poossível, a todos para
superar a nossa espantosa desigualdade social. Razão têm as comunidades eclesiais de base
quando cantam: "Sonho que se sonha só é pura ilusão. Sonho que se sonha juntos
é sinal de solução. Então, vamos sonhar juntos, sonhar em mutirão". Esta é a convocação suprapartidária que a presidenta Dilma
está fazendo ao Parlamento, aos movimentos populares e a toda a nação. Só assim
se esvazia o discurso das divisões, dos preconceitos contra certas regiões e se
sanam as chagas produzidas no ardor da campanha eleitoral com todos os seus
excessos de parte a parte. *Leonardo
Boff, teólogo
e filósofo, é também escritor. É dele o livro ‘Que Brasil
queremos, Vozes, Petrópolis, 2000. - leonardo Boff
Médico Clínico e Sanitarista - Doutor em Saúde Pública - Coronel Reformado do Quadro de Dentistas do Exército. Autor dos livros "Sistemismo Ecológico Cibernético", "Sistemas, Ambiente e Mecanismos de Controle" e da Tese de Livre-Docência: "Profilaxia dos Acidentes de Trânsito" - Professor Adjunto IV da Faculdade de Medicina (UFF)
- Disciplinas: Epidemiologia, Saúde Comunitária e Sistemas de Saúde. Professor Titular de Metodologia da Pesquisa Científica - Fundação Educacional Serra dos Órgãos (FESO). Presidete do Diretório Acadêmico da Faculdade Fluminense de Odontologia.
Fundador do PDT, ao lado de Leonel Brizola, Darcy Ribeiro, Carlos Lupi, Wilson Fadul, Maria José Latgé, Eduardo Azeredo Costa, Alceu Colares, Trajano Ribeiro, Eduardo Chuy, Rosalda Paim e outros. Ex-Membro do Diretório Regional do PDT/RJ. Fundador do Movimento Verde do PDT/RJ. Foi Diretor-Geral do Departamento Geral de Higiene e Vigilância Sanitária, da Secretaria de Estado de Saúde e Higiene/RJ, durante todo o primeiro mandato do Governador Brizola.